Vivemos hoje em constante stress ou em sobrecarga com as exigências do trabalho, família, saúde ou finanças. Há ainda um número infindável de outras pressões pessoais a par de grandes forças que afetam a sociedade como a pandemia, uma economia global inconstante e imprevisível, mudanças climáticas, mudanças culturais e até de género e um nunca acabar de tecnologias úteis mas muitas vezes disruptivas.
A resposta dos dias de hoje para a sobrecarga é tornarmo-nos profissionais multitarefas acabando por aumentar esta sobrecarga, que na realidade não nos traz qualquer alívio. O nosso desempenho quando executamos várias tarefas em simultâneo, é comparável a conduzirmos bêbados.
Por outro lado, nem sempre as ações que ocupam mais o nosso dia estão alinhadas com os nossos sonhos ou o que mais desejamos para as nossas vidas. Apesar de muitos de nós procurarem perceber o que é melhor para si e para os seus, sentimo-nos muitas vezes encurralados pelas circunstâncias da vida atual, alimentadas pelos nossos pensamentos e sentimentos muitas vezes auto destrutivos.
Preocupamo-nos muito com as coisas que queremos fazer e não podemos em vez de fazermos as coisas que podemos fazer mas não fazemos. Este sentimento de se estar encurralado, torna-se a nossa vivência diária. Porque a nossa mente não consegue diferenciar entre imaginação e experiência real. A imaginação e a repetição de pensamentos, cria uma rigidez de percepção que se transforma na nossa realidade.
Como podemos então ser mais honestos para connosco e fazer as mudanças necessárias para reduzir a distância entre as nossas intenções e a nossa realidade?
Trabalhando a nossa agilidade emocional por forma a termos mais flexibilidade na análise das situações e interações, através da aceitação e compreensão do que sentimos e usando esse conhecimento para adaptarmos e alinharmos os nossos valores e ações. Só assim nos libertamos da sensação de bloqueio ou de estar encurralado.
A agilidade emocional é um processo que nos permite navegar pelos altos e baixos da auto-aceitação, com uma visão clara e mente aberta (Susan David).
O primeiro passo é reconhecer que todas as emoções são importantes. Têm um propósito e sinalizam uma necessidade. Infelizmente, a maior parte de nós não desenvolveu a literacia emocional. Somos condicionados desde muito cedo a catalogar erradamente as emoções como positivas ou negativas, reprimindo estas últimas por serem más e indesejadas. Aprendemos a não dar voz ao que sentimos, reprimindo ou mascarando as emoções.
A explosão da Psicologia Pop, das milhares de receitas de auto-ajuda e a venda de soluções rápidas e milagrosas popularizadas pela versão “fast food” do coaching, ampliaram os efeitos da positividade tóxica. Infelizmente, a eficácia da psicologia positiva foi banalizada por esta cultura de consumo e de promessas de rápida transformação aplicada aos processos de mudança, crescimento e tratamento.
A investigação tem demonstrado que tentar substituir pensamentos negativos por positivos pode levar-nos a sentir ainda pior (Susan David). Tentar impor pensamentos felizes é extremamente difícil porque a maior parte de nós não consegue simplesmente desligar os pensamentos negativos e substituí-los por agradáveis. Tentar corrigir pensamentos e sentimentos perturbadores leva-nos a uma fixação não produtiva e até destrutiva. Tal como a metáfora da avestruz com a cabeça no buraco. Na tentativa de ignorar, minimizar ou mesmo mascarar esses sentimentos, podemos criar problemas mais graves como o refúgio obsessivo no trabalho em excesso ou o consumo de substâncias que podem levar à dependência e/ou problemas de saúde (incluindo a comida).
A realidade, é que as chamadas “emoções negativas” estão frequentemente a trabalhar a nosso favor. E a negatividade é normal. Estamos programados para por vezes sentir “negativo”, sendo uma parte fundamental da condição humana.
A expectativa criada pelas nossas culturas e sociedades de consumo, e a banalização da Psicologia Pop para “estarmos sempre bem”, levam-nos a fazer tudo para anular os sintomas do mau estar com medicação, consumo de substâncias, imposição de pensamentos positivos ou outros artifícios que reforçam esta ideia de que não é normal não estarmos bem. A norma passou a ser o bem estar permanente e contínuo e a felicidade, popularizadas pelas redes sociais e muitas vezes associada ao parecer, ter ou poder.
O que fazer então?
1. Viver no presente, dando espaço e folga às nossas emoções e pensamentos, encarando-os com coragem e compaixão. Imaginar as emoções como o nosso mais fiel e verdadeiro mensageiro que nos traz uma informação vital. Libertar o caminho para descodificarmos a mensagem e compreendermos o seu propósito. Só assim poderemos ultrapassar essas emoções e continuar com as nossas vidas.
Poderá ser importante recorrer a ajuda profissional para aprender a fazê-lo, principalmente se está a vivenciar situações de burnout, trauma ou depressão.
2. Aprender a arte da “visão de helicóptero”. Depois de aceitarmos as nossas emoções e pensamentos, iniciar um processo de desapego para os ver em perspectiva e como realmente são: simplesmente emoções e pensamentos. É neste distanciamento, que encontramos a clareza para escolher como responder da melhor forma.
3. Alinhar a nossa resposta com os nossos valores e aspirações a longo prazo. Manter os nossos valores centrais como a verdadeira bússola que nos mantém na direção certa. Por exemplo, supondo que um dos seus valores centrais é a honestidade. Imagine que se sente magoado com alguém importante por algo que essa pessoa possa ter dito ou feito. Depois de ter passado pelos processos anteriores de descodificar o que está a sentir e a pensar, e a necessidade que essa emoção está a responder, clarifique a sua intenção na escolha da resposta. Ou seja, se o valor é a honestidade, qual a sua escolha de resposta que mais se alinha com esse valor? Seria I) conversar com a pessoa, II) guardar e alimentar o ressentimento ou III) encontrar formas de a magoar de volta? Claramente a primeira opção é a que mais se alinha com o seu valor central.
4. Compreender que temos sempre a possibilidade de re-escrever as nossas histórias. Não podemos mudar o passado, mas podemos assumi-lo como uma dádiva que nos ensinou o que sabemos hoje. E usar essas lições como uma plataforma para atribuir novos significados, que nos ajudem a compreender quem somos, como queremos estar e para onde queremos ir.
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